Dependência Química nos presídios é tema de debate na Sejus

18 de junho de 2012 - 03:00

“Dependência Química – causa da criminalidade e entrave à ressocialização” foi o tema do debate desta sexta-feira, 15 de junho, promovido pelo Conselho Penitenciário (Copen), em parceria com a Escola de Gestão Penitenciária e Formação para Ressocialização (EGPR) da Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado do Ceará. Presentes ao encontro servidores da Sejus, representantes de organismos ligados aos segmentos de segurança pública, justiça, pastoral carcerária e de organizações não governamentais, que tratam do assunto drogas sob os variados prismas. O presidente do Copen, Leandro Sousa Bessa, deu as boas-vindas aos participantes. A palestra foi ministrada pelo professor, psicólogo e escritor Odailson da Silva.
 
A secretaria Mariana Lobo ressaltou a importância do momento para a discussão, lembrando a responsabilidade social que estado e sociedade têm para com as questões de saúde, assistência e segurança relacionadas ao combate do uso e tráfico de drogas. “A Sejus ora implementa o Programa de Ações Continuadas de Assistência aos Drogadictos dentro do Sistema Penitenciário, formando equipes de profissionais multidisciplinares (médicos, enfermeiros, dentistas, psicólogos, assistentes sociais), que irão dar suporte às equipes das unidades penitenciárias para que saibam lidar com a problemática.”
 
Droga e criminalidade. Ao falar sobre o uso, o combate e a criminalidade no contexto social dos dependentes químicos, quer seja nos presídios ou fora das muralhas, o professor Odailson da Silva conduziu o seu raciocínio nas linhas do físico, do psicológico, do sociológico, dos direitos humanos e legais. A análise partiu desde “a utilização do álcool, que é a porta de entrada de várias outras drogas, passando pelo cigarro, maconha, cocaína e crack e as ações do governo na batalha contra os seus usos”. 
 
Exemplificou casos mostrando os efeitos de custo versus benefício sobre as políticas de propaganda para combater determinadas drogas, que trazem os malefícios para a saúde pública e o setor previdenciário. Informou sobre os gastos que o dependente tem em relação à cocaína e ao crack, bem diferenciados, fazendo prevalecer o segundo, por se tornar de baixo dispêndio, de fácil acesso, de consumo maior e efeito mais rápido.
Ressaltou “o crack como o grande vilão” na vida dos jovens. Lembrou a angústia dos jovens não terem acesso a determinados produtos, que a sociedade de consumo apresenta, de forma imperativa, veículada em anúncios, nos meios de comunicação de massa. O critério de sucesso na nossa sociedade são os bens de consumo  e os jovens ficam, muitas vezes, na situação de não pertencerem a algum grupo social, onde todos são identificados pelo mesmo gosto desses produtos. Disse que “isto é uma parte da visão do problema que precisa ser analisada.”
Voltando-se para as unidades penitenciárias que acolhem hoje grande número de pessoas que foram levadas ao crime, por intermédio do uso ou do tráfico, o professor Odailson comentou que a igreja, seja qual for, é muito mais um instrumento de ressocialização do que, propriamente o trabalho e a escola. Explicou que na Grécia antiga já utilizavam como um dos primeiros tratamentos para a loucura – o tratamento moral. “Precisamos criar mecanismos na cabeça do indivíduo para dar a ele algo que substitua o que tiraram.”

Prosseguiu: “um dia um presidiário disse para mim que mesmo tendo aprendido a fazer pães e se fosse procurar uma colocação numa panificadora seria sempre visto como um ex-detento. Aí é que eu digo que através da religião ele se sente igual, participante de um grupo social, porque as pessoas o acolhem como um irmão, um igual. O que acontece nas prisões é o mesmo que acontece aqui fora – quem tem vai mandar em quem não tem – eles estão ali pelas mesmas causas e objetivos. Precisamos desconstruir o sistema deles. Todo mundo tem que ter ou não ter nada.”
Na ocasião lembrou da falência das escolas religiosas, de um tempo das casas sem grades, das conversas nas calçadas, dos pedidos e trocas de material dos vizinhos, que permitiam uma proximidade e discussão dos problemas em comunidades. Isto tudo faz parte de uma terapia grupal, uns ajudando aos outros – resolver ou ver nos casos do outro as soluções para os seus problemas. O professor Odailson da Silva confessou, por fim, um sonho “de um dia existir nas unidades penitenciárias um sistema de TV de programação fechada (como a Rádio Livre da Sejus – Ceará está sendo proposta para o sistema penitenciário), que vai dizer é o estado que vai passar, apresentando documentários sobre as drogas; sobre o crack, mães chorando pela situação do filho; dependente pedindo para ser amarrado para não usar droga. Mostrando, também, campanhas de massa com teor ético, moral, religioso, com criatividade e coragem”.
E finalizou “fatores levaram o homem para o mundo do crime, porém outros fatores poderão trazê-lo de volta e fazê-lo enxergar o quanto equivocado está e deixar a bola com ele, para a decisão”.
Assistência nas unidades.  Durante a manhã, o tema continuou com a apresentação do Programa de Ações Continuadas de Assistência aos Drogadictos dentro do Sistema Penitenciário, pelo psicólogo e assistente técnico do PACAD, Elton Alves Gurgel. Segundo ele “temos de reconhecer que não existe saída mágica para este problema. Há a necessidade de trabalhar em conjunto com todas as redes de assistência social e com os 12 passos preconizados pelos narcóticos anônimos. Temos que assegurar a saúde sim do preso, bem como ampliar o acesso ao tratamento. Para tanto, seguimos algumas diretrizes relacionadas aos direitos humanos, à intersetoriedade, à relação de danos e prevenção, dentre outras”.
“As nossas articulações fazemos junto aos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) e Centros de Assistência Psicossocial de Dependentes de Álcool e Drogas (CAPES AD), porque não podemos trabalhar sozinhos”, esclareceu Elton Gurgel. Na sequência, ele enumerou os alicerces do programa que a Sejus desenvolve desde o ano de 2011: o Encontro de profissionais de saúde das unidades penitenciárias; a construção de grupos de trabalho; o encontro com articuladores; a formalização de convênios; o estabelecimento de parcerias; as ações de mobilização nas unidades, a elaboração de uma cartilha sobre o PACAD; a participação no V Encontro Estadual dos profissionais de Saúde e Agentes Penitenciários e a construção de instrumentos de avaliação”.  
Elton Gurgel conclamou a participação de todos e informou que o trabalho já tem início nas unidades da região metropolitana e nas Penitenciárias Industrial e Regional do Cariri e de Sobral. Conclui tecendo comentários sobre o projeto Vidas Independentes, que a Cadeia Pública de Caucaia executa em parceria com os conselhos das comunidades, com o Centro de Assistência Psicossocial de Dependentes de Álcool e Drogas (CAPES AD), da Prefeitura Municipal, e com o apoio da Vara Única do Júri e de Execução Penal da Comarca de Caucaia. O projeto irá desenvolver todo o tratamento clínico, psicológico e terapêutico social dentro da própria unidade prisional.