Internos do sistema prisional cearense confeccionam coleção inédita assinada por estilistas no Ceará Moda Contemporânea 2025
20 de novembro de 2025 - 09:43
O Ceará Moda Contemporânea (CMC) 2025 marcou um momento histórico ao levar para a passarela uma coleção inédita assinada por estilistas renomados e confeccionada por internos do sistema prisional cearense. Pela primeira vez, pessoas privadas de liberdade participaram ativamente da produção de uma coleção completa, transformando talento e dedicação em peças de alta qualidade.

A iniciativa é fruto da parceria entre o Sindicato das Indústrias de Confecção de Roupas e Vestuário do Ceará (SINDROUPAS) e a Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização (SAP). O projeto envolveu ex-ganhadores do CMC, responsáveis pela criação dos croquis e modelagens, enquanto os internos executaram a costura, os bordados e os acabamentos de cada peça. Para tornar o momento ainda mais especial, os familiares dos internos que participaram da produção foram convidados para prestigiar de perto o trabalho realizado, fortalecendo vínculos e valorizando o esforço.

O objetivo é valorizar o trabalho desenvolvido dentro das unidades prisionais e ampliar a visibilidade dos projetos de formação profissional e inserção produtiva promovidos pela SAP. O resultado comprova que aprendizado técnico e dedicação podem gerar produtos de grande relevância cultural, evidenciando o papel da moda como instrumento de transformação social.
Sob o tema “Reencontros”, a coleção apresentou seis looks exclusivos, desenvolvidos por seis estilistas vencedores de edições anteriores do CMC. As peças combinam crochê, renda Tenerife, macramê e costura industrial, demonstrando o talento artístico e a técnica dos internos.

Os costureiros que participaram da iniciativa são contratados pelas empresas Skybeach, Miss Flor, Farda Nova e UP Jeans, integrantes do Projeto “Cadeias Produtivas”, desenvolvido pela SAP para capacitação profissional e geração de trabalho dentro das unidades prisionais. Já os trabalhos artesanais foram produzidos pelos participantes do Projeto “Arte em Cadeia”, reconhecido por transformar o artesanato em instrumento de ressocialização e geração de renda.
Além do desfile, o evento também contou com um ponto de coleta de livros para o Projeto Livro Aberto, iniciativa que permite a remição de pena por meio da leitura e incentiva o acesso à educação dentro das unidades prisionais.

Mais do que um desfile, o projeto representou um encontro entre passado, presente e futuro da moda cearense, reafirmando o compromisso da SAP com a transformação social e a dignificação do trabalho prisional.
A coordenadora de Inclusão Social do Preso e do Egresso da SAP, Cristiane Gadelha, destacou o impacto humano e social do projeto. “A coleção ‘Reencontros’ representa muito mais do que um desfile: é a prova de que a educação, o trabalho e a confiança podem transformar trajetórias. Ver os internos produzindo peças de alto nível, sendo valorizados por estilistas renomados e tendo seus familiares presentes nesse momento tão simbólico nos mostra que estamos no caminho certo. A moda abriu uma porta de esperança, de profissionalização e de dignidade. Este é o propósito da SAP: oferecer condições reais para que essas pessoas possam recomeçar, reconstruir vínculos e visualizar novas possibilidades de futuro. Fico profundamente emocionada e orgulhosa por ver esse reencontro com a vida acontecer na passarela”, concluiu.

Para a assessora executiva do SINDROUPAS, Thais Cunha, o desfile representou muito mais que uma apresentação de moda. “Visitar o sistema prisional e conhecer de perto os internos que produziram cada peça foi uma experiência profundamente transformadora. Ver hoje esse trabalho se concretizando, com familiares presentes e uma coleção impecável na passarela, reafirma que a moda pode ser um caminho de recomeço. Não se trata apenas de roupas, mas de essência, propósito e humanidade. Nós, do SINDROUPAS, queremos a SAP como parceira oficial dos próximos CMCs, porque este projeto mostrou que todos merecem a chance de se reencontrar com a vida e seguir adiante. O CMC 2025 já é um sucesso, e este é apenas o começo”, afirma.

O estilista Ivanildo Nunes, vencedor do CMC em 2009 e participante da coleção “Reencontros”, celebrou o retorno ao evento e a parceria com o sistema prisional. “Estou muito feliz em voltar a esta casa, onde ganhei o primeiro lugar em 2009 e iniciei minha trajetória como designer. Hoje retorno com uma nova roupagem, trazendo para a passarela um look inteiramente produzido dentro do sistema prisional. Esse projeto busca reintegrar, ressocializar e preparar os internos para o mercado de trabalho. Fico imensamente grato pelo apoio da Cristiane Gadelha, coordenadora do projeto, e da Socorro Silveira, que desenvolve um trabalho incrível de reaproveitamento de matéria-prima. Ver a moda se unir a uma possibilidade real de reabilitação é muito significativo. Meu agradecimento ao CMC e ao sistema prisional por construírem essa ponte tão transformadora”, ressalta.
A irmã de um dos internos que participaram da confecção das peças, Ana Paula de Souza, destacou o orgulho em acompanhar a evolução do irmão. “Vim prestigiar meu irmão e ver de perto a peça linda que ele produziu. Fiquei muito satisfeita e emocionada ao perceber o quanto ele está evoluindo, aprendendo e querendo mudar de vida. Ele sempre diz que quer levar esse conhecimento para o futuro, trabalhar com isso e, quem sabe, até abrir um negócio em família. Isso deixa todos nós — principalmente nossa mãe — muito orgulhosos. Estamos na expectativa por esse novo começo e felizes em ver que ele encontrou um caminho para recomeçar”, disse.

O interno Francisco Leonardo de Sousa, que trabalhou na produção dos looks pela empresa Miss Flor, falou sobre a importância da experiência. “Trabalhar aqui é algo muito gratificante. Desde o início, aprendemos bastante, lidando com materiais que antes pareciam difíceis, sempre ao lado de colegas que também estão se ressocializando e buscando uma nova chance. Sou muito grato à SAP e ao nosso governador, porque as mudanças dentro dos presídios fizeram uma enorme diferença. Essa fábrica foi um sonho, e queremos levar essa oportunidade para fora, conquistar uma nova vida e uma mudança verdadeira. Aqui, estamos nos preparando para sair com outros olhares — saber dialogar, buscar trabalho e seguir em frente com dignidade”, afirma.
Sobre o “Arte em Cadeia”
No Ceará, o artesanato é uma das principais atividades oferecidas aos internos, que além de expressar seu lado artístico, desenvolvem novas competências profissionais e elevam a autoestima. A prática ainda contribui para a ocupação produtiva do tempo, a perspectiva de um futuro melhor e a remição da pena.
A Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização, por meio da Coordenadoria de Inclusão Social do Preso e do Egresso (Coispe), fomenta essas ações com o projeto “Arte em Cadeia”, promovendo cultura, qualificação e reinserção social para centenas de internos.
O projeto Arte em Cadeia envolve cerca de 660 participantes distribuídos em seis unidades prisionais no Ceará, que produzem mensalmente aproximadamente 2 mil peças artesanais, totalizando mais de 20 mil itens por ano. Essas peças são confeccionadas em 17 oficinas e comercializadas em diversos pontos de venda em Fortaleza, como Emcetur, RioMar Kennedy, Shopping Benfica, Feirinha da Beira Mar, Seduc, FIEC – Fórum Autran Nunes e Parque Adahil Barreto. Além disso, o artesanato produzido dentro do sistema prisional no Ceará tem um impactado mais de 2.600 internos e internas de 16 unidades prisionais. Além da capacitação profissional oferecida, que inclui o desenvolvimento de habilidades técnicas e artísticas, os internos têm direito à remição de pena, na qual a cada três dias trabalhados um dia é reduzido da pena total.
As vendas geram recursos que são depositados no Fundo Rotativo do Sistema Penitenciário Cearense (FUROPEN), criado pela Lei Estadual nº 17.610, de 2021, e que financia a manutenção das unidades prisionais e ações de reinserção social. Dessa forma, o projeto não só promove a ocupação produtiva do tempo e a qualificação profissional dos participantes, mas também contribui para a sustentabilidade financeira do sistema prisional e a construção de oportunidades para a ressocialização.
Cadeias Produtivas
Os internos participantes do projeto cumprem uma jornada de 40 horas semanais e têm direito à remição de pena — a cada três dias de trabalho, um dia é reduzido do total da pena. O salário é distribuído entre a família do interno, que recebe 50%, um percentual de 25% é depositado judicialmente para uso após a liberdade, e os 25% restantes são revertidos para o sistema prisional, contribuindo com melhorias internas.
Empresários e industriais que desejam integrar o projeto Cadeias Produtivas podem entrar em contato com a Coordenadoria de Inclusão Social do Preso e do Egresso (Coispe) pelos seguintes canais: telefone (85) 3101-7714 ou e-mail cispe@sap.ce.gov.br.